Provocados pelo Sindsep‑MT, Condsef e Cnasi se reúnem contra Portaria nº 1

As duas maiores representações dos servidores do Incra se juntam contra o desmonte do órgão e despejos imediatos de associações

 

Atendendo a uma provocação do Sindsep-MT, aconteceu no dia 19 de janeiro, reunião por videoconferência com os servidores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Confederação Nacional das Associações dos Servidores do Incra (Cnasi) e a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef). Participaram 40 pessoas de 18 estados para discutirem a tentativa de desmonte do órgão pelo governo federal.

 Em dezembro, através do nosso jornal mensal, foi estampada na capa a manchete “Incra quer terceirizar o trabalho de campo favorecendo a grilagem”, onde denunciava a Portaria Conjunta nº 1, de 2 de dezembro, publicada no DOU, assinada pelo Secretário Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Luiz Antonio Nabhan Garcia e o presidente do Incra, Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo Filho. Essa portaria institui o programa “Titula Brasil” que na prática terceiriza o trabalho de campo firmando acordos com as prefeituras como vistoria e checagem de dados, favorecendo principalmente a grilagem de terras, políticos e os barões do agronegócio.

 Preocupados com a situação, no dia 7, em Brasília, o presidente do Sindsep-MT, Carlos Alberto de Almeida e seu vice, Elias Belisário, que é servidor do Incra, se reuniram com Sérgio Ronaldo (Secretário-geral da Condsef/Fenadsef) e com o diretor da Cnasi, Reginaldo Marques Félix de Aguiar, ocasião em que foram discutidos os problemas enfrentados pelo órgão e em consenso foi marcada a reunião não presencial.

Portaria e despejo - Sérgio Ronaldo disse que assim que tomou conhecimento da portaria, assumiu o compromisso de que no começo do ano seria uma das primeiras pautas por conta da gravidade do que significa essa “Titula Brasil”. Em conversa com os representantes da Cnasi e Sindsep-MT, foi marcada reunião por videoconferência já no dia 19, com pauta ampliada e debates mais consistentes com relação a Portaria Conjunta nº 1 e o despejo pelo Instituto, dos espaços das associações que há décadas ocupam e que foram conquistados legitimamente pelos servidores.

 Exemplo triste - Carlos Alberto de Almeida demonstrou preocupação e citou a descentralização dos colegas da Funasa quando foram colocados à disposição dos municípios. A princípio, a portaria dizia que os servidores é que iriam formalizar as políticas de saúde e as diretrizes mas, segundo Carlos, foi conversa fiada, uma balela.

 “Hoje os servidores da Funasa estão largados nos municípios e muitas vezes o RH não sabe onde eles se encontram. O sindicato tem melhor informação que o próprio órgão com relação a localização destes funcionários. E esse programa ‘Titula Brasil’ nada mais é que uma descentralização e logo os servidores do Incra estarão a disposição dos municípios e vai acontecer o mesmo que aconteceu com a Funasa. Essa é a grande preocupação minha e a de vários colegas quando procuramos a Confederação”, disse Carlos.

Prenúncio - A portaria diminui o papel do Incra ao ser repassadas atribuições aos municípios e o efeito colateral disso é que vai acontecer a regularização fundiária de grilagem pelo país afora. Além disso vai ter impacto ambiental, vai aumentar a degradação de áreas protegidas da União, vai ter prejuízo para as comunidades indígenas, quilombolas. Segundo Reginaldo Marques, a percepção no Incra é de que 70 a 90 por cento de áreas não regularizadas na Amazônia Legal e parte do Centro-Oeste, são áreas de grilagens.

A União é a responsável pela regularização de terras no Brasil, cabendo esta função ao Incra, então essa ação de terceirização do órgão fere a Constituição. Este ponto de vista foi destacado na imprensa, repercutindo em vários veículos de comunicação. Dias depois, o próprio presidente da República, junto com o presidente do Incra e o secretário Naban, participaram de uma live sobre esta temática e lá, mais uma vez, desdenharam o assunto, disseram que a gente estava equivocado”, disse o diretor da Cnasi.

As informações que nós temos são desencontradas, não conseguimos nem confirmar se foi montada uma equipe. Se está, está sendo de forma secreta, sem a participação de servidores e seus representantes diretos. Esse tema nos preocupa muito, porque como citou o presidente do Sindsep-MT, colega Carlos Alberto, isso é um aviso do que aconteceu com a Funasa, que é um órgão megaimportante, mas que com o tempo foi sendo terceirizado, municipalizado, e hoje perdeu aquele brilho que tinha. Isto é um prenúncio do que vai acontecer com o Incra e pode acontecer com a Funai, Ibama e ICMBio.

Ilegalidade - José Neto, de Mato Grosso, lamentou a dificuldade operacional de atender a sociedade nestes 10 anos como servidor do Incra. A aplicação direta desta portaria talvez tenha sido para atingir alguns pontos, principalmente políticos, mas ela esbarra na ilegalidade.

Os nossos patrões são muitos atrapalhados e essa questão da segregação radical dentro do que vinha sendo feito por outros governos chega a ser burro de não dar continuidade. A tradução resumida da portaria que a gente conversou aqui no Estado é a de que algumas prefeituras teriam condições de fazer uma cooperação técnica, até porque os municipais são servidores públicos também. Mas eles não podem decidir. A gente aumentaria muito a capacidade de processo mas a análise tem que ser federal”, acrescentou.

Já no final da reunião, Sérgio Ronaldo disse que uma situação como esta não pode ser executada de forma monocrática, através de portaria e nem via decreto. “Teria que ser via parlamento. Nossa assessoria jurídica vai analisar os três pedidos de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e se for da forma que pensamos, vamos agregar nestas ações como ‘amicus curiae’, finalizou.

Trabalho remoto - Com apelos negados para que o órgão revisse a questão da volta presencial dos trabalhadores em plena pandemia, a Cnasi entrou com ação no Ministério Público do Trabalho (MPT) e caso fosse determinado o retorno, que seja com segurança, obedecendo os protocolos de biossegurança e o exame anti-covid garantido para todos. “Mas o que sabemos é que em alguns estados nem sensor de temperatura tem. Só na sede do Incra, mais de 100 pessoas foram contaminadas, incluindo 3 superintendentes”.

Em Cáceres - Marcelo Henrique, chefe da unidade em Cáceres disse que estão há 1 ano e meio sem contrato de limpeza e que os próprios servidores estão fazendo a limpeza no prédio e de vez em quando pagam uma diarista.

Sobre trabalho remoto, Marcelo disse que 90% dos servidores têm mais de 60 anos e relatou para a Ouvidoria do órgão que vai continuar com o trabalho remoto para a preservação da vida dos servidores e acrescentou a falta de estrutura para trabalhar. “Invés de pedir ajuda para as prefeituras, teria que nos dar maior estrutura para trabalhar. A maioria dos processos são físicos e não temos nem equipamento para digitalizar. Olha o tamanho da dificuldade. Sou a favor que permaneçamos em trabalho remoto fazendo o que é possível, da melhor maneira possível”, disse Marcelo.

Sobre os despejos das associações cujos espaços foram conquistados pelos servidores, foi recomendado que as assessorias jurídicas analisem as possibilidades de ajuizar ação judicial para reverter a decisão. Algumas associações inclusive, já entregaram as chaves dos espaços ocupados e brigam para não ter que pagar pelo aluguel retroativo, como quer a direção do órgão.