O cenário para servidores federais tem se revelado cada vez mais desafiador com um governo que demonstra que sua política para o setor público está pautada em arrocho e austeridade. Acumulam-se nesse cenário, além de expedientes administrativos que impõem a "canetadas" uma reforma administrativa, sem o devido debate, medidas que, nos próximos anos, colocam em risco o próprio funcionamento dos serviços e das políticas públicas no Brasil. A notícia mais recente que reforça esses planos foi publicada em matéria do Valor Econômico. O governo revela a intenção de manter reajuste de servidores em 1% ao ano pelos próximos dez anos. Com salários congelados há mais de dois anos e perdas salariais calculadas pelo Sinal e Dieese em até 33%, a maioria dos servidores federais deve reagir.
A projeção de 1% considera o chamado "mínimo prudencial" que é o valor para manter a folha de pagamento da União. Estimativas sugerem que o percentual não cubra sequer o crescimento vegetativo da folha de pagamentos da União, considerando progressões em carreira, entre outros fatores. Para isso, o governo já deu sinais do que também pretende: não repor com novos concursos a força de trabalho que deve se aposentar nos próximos anos. Como a Condsef/Fenadsef vem alertando, a soma de vários desses fatores, incluindo também a Emenda Constitucional (EC) 95/16, que congela investimentos públicos por vinte anos, pode trazer como resultado um colapso no atendimento público a que os brasileiros têm direito.
Outra notícia divulgada na última semana dá conta de que o governo estuda, inclusive, o fim do reajuste linear, garantido na Constituição Federal aos servidores. A informação foi publicada pela jornalista da Globo News Cristiana Lôbo, no portal G1. De acordo com a repórter, o valor do reajuste passaria a ser diferenciado por categoria ou por funcionário, a partir de avaliação feita pelo cidadão ao utilizar o serviço público.
O formato sugerido seria similar ao usado no comércio com máquinas onde o público avaliaria a satisfação com o serviço. No entanto, o ministro da Economia, Paulo Guedes, desconsidera particularidades que o setor público possui e que não poderiam jamais ser mensuradas dessa forma. Não fica claro como isso será aferido em áreas de fiscalização, combate a sonegação, na própria saúde e educação. Para a entidade isso representa até mesmo o desconhecimento do governo sobre o que representa o setor público, incluindo a ideia de investir em digitalização dos serviços públicos também defendida por Guedes.
O anúncio de sucessivos cortes bilionários e intervenções administrativas em áreas essenciais como Educação, Saúde, em pesquisas, na Ciência e Tecnologia, na Cultura, no Meio Ambiente, na Agricultura e em tantos outros setores, revela o desinteresse do governo em assegurar serviços públicos para a população. "Essa política de estado mínimo já conhecemos. No que chamamos de anos de chumbo de FHC, ficamos por oito anos com salários congelados, havia servidor recebendo complementação para alcançar o valor do salário mínimo, enfrentamos demissões em massa no governo Collor", lembra Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Condsef/Fenadsef. "As decisões aceleradas que este governo vem adotando nos dão a dimensão do grande desafio que temos pela frente", avalia.
Para Sérgio, mobilização e unidade serão ingredientes indispensáveis para impedir retrocessos graves não apenas em direitos, como na garantia de existência do setor público. "Estamos acompanhando a tentativa de romper com o pacto federativo assegurado pela nossa Constituição e esses avanços sociais não podemos permitir que sejam perdidos", conclui. "Com quase trinta anos de luta em defesa dos servidores e serviços públicos sabemos que o caminho que sempre nos garantiu avanços e conquistas foi o da mobilização e da unidade", reforçou. Sérgio lembra ainda da Campanha Salarial 2006, onde uma mobilização importante conseguiu aporte de cerca de R$6 bilhões no orçamento daquele ano para assegurar cumprimento de acordos firmados com diversas categorias.
Além disso, a Condsef/Fenadsef questiona que mais uma vez os servidores estão sendo encarados como problema orçamentário. Pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), a relação entre os valores investidos em serviço público com relação ao PIB estão controlados e dentro da margem desde que a lei foi criada, em 2000. A subseção do Dieese acompanha essa evolução e os estudos desmistificam o discurso de "inchaço". Para a Condsef/Fenadsef, ao contrário, o investimento no setor público garantiria um importante impulso na economia que não tem apresentado sinais de reação.
Outro mito que precisa cair por terra é o discurso que reforça que a reforma da Previdência está sendo feita para combater privilégios de servidores públicos. Ocorre que, mais uma vez, os dados desmentem essa versão. Apenas para ilustrar basta dizer que a maioria dos servidores do Executivo recebe menos que o teto do INSS e, portanto, não seriam afetadas pelas mudanças propostas. Para muitos servidores há riscos de injustiça no cumprimento de tempo de serviço, o que poderia forçar os que estão perto de se aposentar a ter que trabalhar muitos anos a mais para alcançar seu direito de aposentadoria. "Essa injustiça precisamos lutar para impedir", aponta o secretário-geral da Confederação.
A Condsef/Fenadsef ainda aponta as incoerências no discurso de austeridade quando verifica a postura adotada para outras categorias. No orçamento desse ano o governo vetou reajuste para servidores civis assumindo que militares estão assegurados. Vale lembrar que a própria reforma da Previdência proposta pelo governo para militares foi acompanhada de uma reestruturação na carreira que prevê percentuais de reajuste acima da inflação. Não se pode esquecer os 16% de reajuste autorizados a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Sérgio Ronaldo ainda lembra outra dificuldade imposta com a interferência do governo na livre organização dos servidores que afeta as entidades sindicais com a MP 873/19. Os ataques são muitos e constantes, mas a resistência deve continuar. "Nós não vamos aceitar esse cenário e vamos lutar para assegurar o reconhecimento e a valorização dos servidores e serviços públicos como fazemos há quase três décadas. Vamos resistir", concluiu.
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